Eduardo Ribeiro, o visionário pensador

Por : Alfredo Mário Rodrigues Lopes em 1993
Oriundo do Maranhão, o Pensador como era conhecido desde sua juventude, fundou um jornal satírico com esse nome junto com Aluísio Azevedo, Graça Aranha, Pedro Freire e outros jovens revolucionários na efervescente São Luís da segunda metade do século XIX.
Cutucavam com a vara curta da iconoclastia o sonolento e escravagista império colonial e eclesial nos anos 90 daquele século. Mais tarde, junto com Deodoro e Floriano, na Escola Militar da Praia Vermelha, Rio de Janeiro, Eduardo Ribeiro mobiliza em torno do positivismo de Benjamin Constant a resistência abolicionista e antimonárquica que lhe custará o exílio na longínqua Amazônia, onde irá servir como capitão do Exército até a eclosão da República, primeiro no Pará e depois no Amazonas, em que servirá como governador do Estado, primeiramente nomeado, depois eleito pelo voto popular.
Filho de Florinda Maria da Conceição, escrava alforriada pelas leis que antecederam o 13 de maio, Ribeiro tem sua memória, ainda hoje, associada a uma trama de corrupção e morte que a história insiste em manter intocada. Governou o Amazonas, À época o Estado mais rico da federação, apenas quatro anos após a abolição da escravatura, transformando radicalmente a sua paisagem urbana e social. Manaus era chamada de a Paris dos Trópicos pelo seu esplendor urbano. A história dos que pagam a gráfica da verdade segundo seus interesses miseráveis, o fez branco e suicida, mesmo que lhe sobrassem motivos para fazer jus à vaidade de sua negritude, além das razões sobejas de viver e sonhar.
À parte a investigação que se impõe sobre intrigas e mutretas que marcaram seus mandatos, que incluem duas tentativas armadas de deposição, à base da baioneta, a trajetória desse multado, tendo em vista a ousadia extremada de suas realizações, sugere uma interpretação psicanalítica clássica para elucidar tanta ambição administrativa e tantos feitos em favor da urbanidade comospolita manauara. Obstinado pela cultura branca, da qual o Teatro Amazonas é o emblema maior, Ribeiro diferentemente dos demais governantes do Ciclo da Borracha, mostrou como transformar a potencialidade dos recursos naturais da floresta em fausto e prosperidade social. As tímidas comemorações do centenário do Teatro, ocorrido há quatro anos, resultante do descaso com a história e a cultura do Estado, não conseguiram obscurecer a audácia de seu construtor. Coerente com os pressupostos que o moveram a construir a arquitetura manauara, a Eduardo Gonçalves Ribeiro se deve o primeiro Plano Diretor da cidade, o sistema inglês de saneamento urbano, a luz elétrica, a telefonia, os bondes e uma obra gigantesca em saúde e educação. Para implementar a multiplicidade de seus projetos, patrocinou com planejamento e estrutura a migração de trabalhadores nordestinos, sobretudo maranhenses, para dar a Manaus a paisagem agradável que resiste ao tempo e ao descaso de governos posteriores.
Revisitar a saga do Pensador é, sobretudo, vasculhar na memória a relação entre poder público e cidadania, e assegurar com veemência que o bem comum deve e tem que ser objetivo constante dos governantes, jamais atalho para enriquecimento pessoal.
A administração de Ribeiro sinaliza com eloquência o que é insistir no desafio que transformou biodiversidade em progresso e prosperidade.
Se não logrou alcançar a permanência dessa equação é uma outra estória que remete à mentalidade colonial que ainda persiste na cabeça de quem tem governado o país desde o império.
Não conseguimos perenizar o fausto por não termos apostado na pesquisa científica e na estrutura industrial para ampliar e diversificar a economia florestal.
Entre os viajantes europeus que associaram há dois séculos, banco genético com modernidade e os teólogos do descobrimento, ficamos com estes contemplando a floresta como um dom divino que de tão celestial deve permanecer intocado. Que diria a respeito, o visionário Pensador, cem anos depois?
